QUEM NOS SALVA?

A crise é, irremediavelmente, uma permanência contemporânea. Das crises financeiras às crises migratórias, passando pelas bélicas e sanitárias, é difícil encontrar no passado recente um momento de bonança no estado do mundo. Estas crises múltiplas provocam, de modo agudo, tensões sociais e políticas e todas as formas de violência subsequentes.

As crises migratórias dos e para os refugiados, as alterações climáticas e o Antropoceno, o regresso dos totalitarismos e dos partidos de inspiração fascista, os metadados e a colonialidade digital, a discriminação de género e os entraves à sua auto-determinação, o racismo (também estrutural), a homofobia e a transfobia, a precaridade laboral, a pobreza, assim como a interseccionalidade de todas estas discriminações, são apenas algumas das protuberâncias críticas de um mundo em crise. É urgente perguntar quem nos salva e não de forma retórica. Por isso, esta exposição ensaia respostas e identifica determinadas fissuras críticas que cobrem o planeta.

De modo especulativo e acompanhando a postura de Donna Haraway em Staying with the Trouble, QUEM NOS SALVA? não foge aos problemas complexos do contemporâneo. Se por um lado, assume a imensa gravidade e amplitude dos obstáculos com que a maioria dos seres humanos e não humanos se deparam, por outro, convoca um optimismo responsável que rejeita a passividade perante a(s) crise(s). As obras que compõem a exposição são respostas activas à questão colocada: são denúncias, referências, caminho, esperança, solução. À proficiência e suficiência plástica que contêm junta-se a consciência do permanente estado de excepção de que fala Giorgio Agamben.

Em O que nós vemos, O que nos olha, Georges Didi-Huberman situa as criações artísticas enquanto imagens críticas, que acompanham a condição do mundo. De acordo com o autor, a imagem crítica é “[ … ] uma imagem em crise, uma imagem que critica a imagem -capaz, assim, de um efeito, de uma eficácia teórica -e, nessa medida, uma imagem que critica os nossos modos de ver no momento em que, ao olhar-nos, nos obriga a olhá-la verdadeiramente. E a escrever esse mesmo olhar, não para o transcrever, mas para o constituir”. QUEM NOS SALVA? articula diversas imagens críticas, que incluem olhares e diálogos múltiplos, não sendo nunca prescritivas ou monolíticas. As obras de arte constituem, aqui, imagem dialéctica -que é imagem crítica -, pois edifica-se numa anacronia e justaposição de temporalidades em que os espaços em branco entre distância e proximidade são preenchidos pela aproximação crítica de quem olha essas mesmas imagens -o espectador emancipado, como diria Ranciere. É nessa aproximac,ão crítica que as imagens se convertem em linguagem e se tornam reflexão, nas diversas acepções da palavra.

Esta exposição é, portanto, formada por um conjunto de reflexões que se quer reflexão conjunta, em rede e cooperação como nos mostra a celebração dos 15 anos de MACE. Podemos não saber exactamente quem nos salva e perceber que a arte per se não é solução; todavia, sabemos que sem arte não haverá salvação.

Ana Cristina Cachola
Julho de 2022

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Créditos: Pedro Magalhães